No jornal Público surge um relato sobre a realidade de um call center da Portugal Telecom em Coimbra: condições de trabalho ultra-precárias e ordens da empresa para ocultar informação dos clientes.
É um artigo revoltante pela forma ultra-precária e atemorizadora como são tratados os funcionários (contratados à quinzena como carne para canhão) e pela forma com que, por instrução da empresa, os operadores estão proibidos de esclarecer os clientes de situações penalizadoras para si.
Para a empresa é lucrativo lidar com alguns clientes que se sintam posteriormente enganados se conseguirem com esta prática enganadora garantir a inação de uma larga maioria.
O relato da desinformação que os call centers terão promovido aquando da instalação da Televisão Digital Terrestre induzindo os potenciais clientes a subscreverem serviços pagos para continuarem a ter televisão são outro dos relatos testemunhados por operadores deste call center aos jornalistas do Público.
Onde ficam os limites éticos de um empresa como a PT? os clientes são obrigados a pensar que têm do outro lado do telefone um agente de má fé que o quer explorar.
Eis excertos do artigo do Público com o título “Se não estás satisfeito, a porta de saída é ali” disponível na versão impressa de dia 11 de agosto de 2013 e com versão integral online para assinantes do Jornal:
“Trabalhar num call center é viver num mundo de pobreza, instabilidade, pressões e humilhações. O centro da PT em Coimbra é descrito por muitos como “um inferno” (…)
“Para Nuno, o pior de tudo era ter de enganar os clientes. Trabalhou no enorme call center da Portugal Telecom em Coimbra, antes de vir para a Teleperformance, em Lisboa. Em Coimbra trabalhou no sector outbound (quando é o operador que faz a chamada, geralmente para vender) da MEO. “Tínhamos de dar a entender às pessoas que, se não comprassem o serviço MEO, ficariam sem televisão, o que era mentira”, recorda Nuno.
Era o período em que foi introduzida a Televisão Digital Terrestre (TDT). Quem não tinha qualquer serviço por cabo teria de instalar um descodificador para continuar a ter sinal de televisão. Não era necessário aderir ao MEO, mas os operadores só explicavam isto se o cliente o perguntasse explicitamente. As instruções que tinham eram claras quanto a isto.
Carlos ainda trabalha no call center da PT de Coimbra. Ou melhor, em teoria é empregado da Vertente Humana, uma empresa de trabalho temporário com a qual tem um contrato de 15 dias, renovável automaticamente, embora com uma curiosa modalidade de funcionamento. Carlos, que vende igualmente serviços da MEO, conta que também é obrigado a enganar os clientes.
Ao contactar clientes de outras redes, aliciando-os a aderirem ao serviço M4O, tem instruções para não referir nunca que o cliente terá de mandar desbloquear o seu telemóvel, com os custos inerentes. Só se tal for perguntado explicitamente — “E eu terei de mandar desbloquear o meu telemóvel?” o operador pode confirmar. Mas se o cliente perguntar, por exemplo, “E não terei de fazer mais nada? O serviço fica logo disponível?”, o operador está proibido de lhe dizer que terá de mandar desbloquear o telemóvel.
Se o cliente, mais tarde, se sentir enganado e protestar, o operador é penalizado. Carlos relata outro caso, que aconteceu no mês passado. Na venda do serviço M4O (que inclui chamadas grátis de telemóvel), os operadores têm instruções para nunca dizer ao cliente que, ao aderir, terá anulado todo o saldo que possa ter no Cartão SIM. Mais uma vez, só poderá dar essa informação se o cliente se lembrar de o perguntar explicitamente.
Todos os operadores contactados afirmaram estar a trabalhar através de agências de trabalho temporário, e ter contratos de 15 dias. Eis como funciona: a meio de cada mês, o trabalhador recebe em casa uma carta de despedimento. Com alguns, isto acontece quase todos os meses, com outros, em apenas alguns meses por ano. Depende da produtividade, e eventualmente de outros factores.
Carlos acaba de receber uma dessas cartas, registada, como sempre. (…) Chegado ao local de trabalho, no dia seguinte, o supervisor explica que a produtividade não tem sido a melhor, e que, a continuar assim, o contrato não será renovado, como a carta de resto já formaliza. “Tens 15 dias para melhorar a performance”, diz o supervisor.
Será então preciso trabalhar a dobrar, para “cumprir os objectivos”. Isso significa trabalhar durante os fins-de-semana e dias de férias, e a possibilidade de fazer isso ainda é considerada um grande favor da empresa, para que o trabalhador consiga “cumprir os objectivos” e não seja despedido. (…)
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